segunda-feira, 17 de novembro de 2014

PÃO E REDENÇÃO



Pão e redenção. (*)
José Angelo da Silva Campos

Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer.” (Jo 15,5)

“Sem mim nada podeis fazer”, disse Jesus. E mesmo assim o nosso mundo continua a investir numa vivência apóstata: A busca daquilo que se possa pegar. Uma fé em coisas palpáveis. A matéria clama o seu sustento naquilo que é composta, matéria precisa de matéria.
Aceitar a fé em Jesus Cristo passa a ser possível somente com a sua adaptação às coisas deste mundo. O Jesus teria que ser pão que mata a fome, fome de alimento para o corpo, alimento para a autoestima e para esta vida que tocamos, vemos, ouvimos e garantimos pelos nossos sentidos a sua realidade.
Para o pensamento mundano, Deus não é real.
Assim, em toda a história da humanidade, e principalmente em nosso tempo, o Anjo Caído, que crê verdadeiramente na existência de Deus e é incapaz de amá-lo, provoca no homem a dúvida da existência de Deus, cobrando provas sobre ela em relação às benesses materiais, expondo ainda largo sorriso quando, de brinde, consegue convencer inclusive da negativa da sua própria existência (o demônio e o inferno não existem!?).
Transformado numa filosofia, Deus passa a ser definido conforme oscila o pensamento. Adaptável a qualquer situação deixa de lado toda e qualquer cobrança. Há a deturpação da explanação de que “Deus é Amor”, como justificativa para tudo que se faz com uma moral e éticas próprias e egoísticas. Até se mata por amor.
A dificuldade que o homem tem para relacionar-se com o transcendente, o apego natural à forma empírica de viver a vida, essa exagerada aproximação da matéria, tudo isso facilita a ação tentadora do demônio que lança na mente humana os questionamentos da prova de Deus, Jesus Cristo o Filho de Deus e sua Igreja.
“Se és o Filho de Deus, ordena que estas pedras se transformem em pão” (Mt 4,3) – assim diz a primeira tentação. As palavras “se és o Filho de Deus...” serão ditas novamente, pouco depois, pelos escarnecedores junto da cruz: “Se és o Filho de Deus, então desce da cruz...”(Mt 27,40). (...) para se tornar digno de fé, Jesus deve apresentar a prova para a sua pretensão. (...) se Tu existes, ó Deus, então tu mesmo te deves mostrar. Então deves retirar as nuvens do teu escondimento e dar-nos a clareza que pretendemos. Se Tu, Cristo, és realmente o Filho e não um dos iluminados, como sempre aparecem na história, então Tu deves mostrar isso de um modo muito mais claro do que o fazes. E então Tu deves dar à Tua Igreja, se ela verdadeiramente deve ser a Tua, uma outra medida de clareza, diferente daquela que na realidade tem. “ (**)
“ordena que estas pedras se transformem em pão”.
Mate pois a fome da humanidade, a fome material. Por redentor, o homem espera alguém que lhe tire todo e qualquer sofrimento físico. Espera alguém que o livre da cruz. Alguém que transforme o mundo com as medidas que o mundo oferece (prazer, lazer, paz, saciedade, justiça, igualdade, etc.).
Nessa ilusão da busca de um mundo medido pelas coisas materiais, há promessas utópicas, de forma aliada às pretensões do demônio nas suas tentações, tais como:
A da igualdade e justiça na oferta do pão redentor que mata a fome dos excluídos, num engodo filosófico de trazer a paz sem Deus, com um endeusamento (idolatria) do poder, imposto pelo marxismo;
E em paralelo a isso, a vanglória de buscar, também no progresso e na exaltação do indivíduo, pela prática de um capitalismo sem Deus (a idolatria da imagem humana), tendo como objeto a ganância que provoca a fome e a segregação dos povos.
Todos sem Deus, com a promessa do pão que mata a fome (matéria), excluindo o homem do acesso ao Único e verdadeiro Pão da Vida.
“ ... a Última Ceia, que se torna Eucaristia da Igreja e o permanente milagre do pão de Jesus. Jesus mesmo se tornou o grão de trigo que deve morrer, para que dê muito fruto (Jo 12,24). Ele mesmo se tornou pão para nós, e esta multiplicação dos pães dura inesgotavelmente até o fim dos tempos. Assim compreendemos agora a palavra de Jesus, que Ele retirou do Antigo Testamento (Dt 8,3), para com ela repelir o tentador: “ O homem não vive só de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4,4).  (**)


(*) Inspirado na leitura do: ...
(**) recorte do: ...
 Capítulo 2 “As tentações de Jesus” do livro Jesus de Nazaré  – Primeira Parte – Do Batismo no Jordão à Transfiguração – Joseph Ratzinger – BENTO XVI – Tradução José Jacinto Ferreira de Farias, SCJ – Editora Planeta 2013

sábado, 15 de novembro de 2014

SER FIEL NO POUCO - QUESTÃO DE ESCOLHA



Ser Fiel no Pouco – Questão de Escolha
José Angelo da Silva Campos


Nos atos simples do nosso dia expressamos o conteúdo do nosso ser.
Os doutores da psiquiatria e da psicologia usam um termo chamado psicoadaptação para definir a forma como nós somos capazes de retomarmos a rotina da nossa vida após uma grande perda (morte de um parente, uma falência, a perda de um membro do corpo, etc.), ou seja, nós passamos a entender como sendo uma coisa normal o fato trágico ocorrido conosco. Também pelo mesmo fenômeno psíquico, tornamo-nos dependentes químicos ou físicos, ou seja, nosso organismo entende que o uso de determinadas substâncias é normal e essencial à nossa vida em face dessa adaptação psíquica. Portanto, o fenômeno da psicoadaptação existe para nos proteger do sofrimento, mas, ao mesmo tempo, pode tornar-se um grande dificultador para a nossa reação aos vícios da vida.
Tal relação entre a nossa rotina diária e a transformação dos nossos atos em normais e/ou essenciais à nossa vida, pode ser fortemente notada com relação aos pecados e à criminalidade.
dizia Santo Agostinho: “A neve recém caída derrete com facilidade. Mas se o sol não a atinge endurece. E, acumulando-se ano após ano, resistindo às investidas do clima, torna-se uma grande geleira, uma montanha de gelo. Algo parecido ocorre com os pequenos pecados. Fáceis de eliminar no princípio, acumulados vão endurecendo pouco a pouco e, conservados por muito tempo longe da ação da graça, tornam-se quase incorrigíveis.” (Enarrationes in psalmis – 147, 1-2)
Quando passamos a mão sobre a cabeça dos nossos filhos nos seus pequenos erros, sem repreendê-los, ou damos a eles o exemplo praticando pequenos delitos (pequenas piratarias, pequenos subornos, etc.), ou comentamos com ar de aprovação as perversidades da vida, tais como o aborto, a corrupção, o consumo de drogas ilícitas e a sexualidade desregrada, geramos no inconsciente (nosso e das crianças) o fenômeno da psicoadaptação, e corremos o sério risco de entendermos como naturais crimes e pecados de grande monta, construindo em nossos filhos personalidades materialistas e divididas entre a Luz e a treva.
No Evangelho, segundo Lucas, 16, 10-13, Jesus disse: “Quem é fiel nas pequenas coisas será fiel também nas grandes, e quem é injusto nas pequenas será injusto também nas grandes. Por isso, se não sois fiel no uso do dinheiro iníquo, quem vos confiará o verdadeiro bem? E se não sois fieis no que é dos outros, quem vos dará aquilo que é vosso? Ninguém pode servir a dois senhores. Pois vai odiar a um e amar o outro, ou se apegar a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”.
Portanto, a escolha é nossa: Ser cristão verdadeiro, expressando na face a imagem de Cristo, ou permanecermos “em cima do muro” (para algumas coisas somos cristãos e para outras contamos com a misericórdia divina).
Tratemos com atenção redobrada os nossos atos rotineiros; sejamos um pouco mais severos conosco e busquemos evitar ou corrigir nossos pequenos desvios, para que não nos acostumemos com a falta de amor, de caridade, de respeito ao próximo e de zelo às coisas alheias.
E agindo assim, tornemo-nos semeadores da Paz e do Amor que o nosso Salvador de graça nos concede.