Reconhecer o sagrado, seja o espaço, seja o tempo,
é essencial ao católico e, ao mesmo tempo, intrínseco à sua fé.
Jesus chorou sobre Jerusalém que não reconheceu o
tempo da visitação: “Quando Jesus se aproximou de Jerusalém e viu a cidade,
começou a chorar. E disse: “...porque não reconheceste o tempo em que foste
visitada”. (Lc 19, 41, 44b)
O espaço sagrado é o lugar reservado para Deus,
santificado (o interior de uma Igreja, por exemplo) e o tempo sagrado é o kairós,
ou seja, o tempo oportuno, o tempo da justa medida, o tempo em que Deus age.
O Ano Litúrgico é o tempo de santificação,
verdadeira escola de santidade, é o tempo sagrado que começa no primeiro
Domingo do Advento, tem seu ponto mais alto na Páscoa e termina na solenidade
de Cristo Rei. É o tempo oportuno, a ação de Deus no tempo.
A cada ano litúrgico “o Povo de Deus volta a
pôr-se a caminho, para viver o mistério de Cristo na história”¹.
O Advento, palavra de origem latina que significa
vinda, chegada, e que na linguagem cristã refere-se à vinda de Deus, à sua
presença no mundo, quando estabelecido na cronologia do Ano Litúrgico, nos
convoca a um momento de penitência, uma penitência com sentido diferente
daquela do tempo da quaresma. Uma penitência de vigília, de preparação para a
vinda do Senhor, “vigiai e orai”.
Nesse tempo somos exortados a nos associarmos a
João Batista que prepara a vinda do Messias, a voz que clama no deserto, e ao
ícone do Advento, a Virgem Maria que “encarna perfeitamente o espírito do
Advento, feito escuta de Deus, de desejo profundo de fazer a Sua vontade, de
serviço jubiloso ao próximo”¹, para vivermos a expectativa da vinda
gloriosa de Jesus, bem celebrando os mistérios da Sua encarnação e da sua total
presença no meio de nós, cumprindo a missão de anunciar ao mundo que “Jesus
é o vivente, a própria vida”²:
“Jesus se aproximou deles e disse: ‘Foi me dada
toda a autoridade no céu e na terra. Ide, pois, fazer discípulos entre todas as
nações, e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes
a observar tudo o que vos tenho ordenado. Eis que estou convosco todos
os dias, até o fim dos tempos’.”(Mt 28, 18-20)
Deus se revela a Adão, o primeiro homem, e pede a
sua amizade.
Criado à imagem e semelhança de Deus, o homem,
sucumbido pelo pecado, perde a semelhança ao Deus criador e distancia-se do Seu
amor.
Deus, que criou o homem por puro amor, não desiste
dessa amizade e, no tempo oportuno, aos poucos Se revela, preparando o seu povo
para a grande reconciliação, a revelação plena para a redenção da humanidade, “Et
Verbum caro factum est et habitavit in nobis” (E o Verbo se fez homem e
habitou entre nós).
“De fato, Deus amou tanto o mundo, que deu o seu
Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna.”
(Jo 3,16)
“Com a sua vinda ao meio de nós, Deus indica-nos
e confia-nos também uma tarefa: precisamente a de ser semelhantes a Ele e de
tender para a verdadeira vida, de alcançar a visão de Deus, no rosto de Cristo.
Santo Irineu afirma ainda: ‘O Verbo de Deus pôs a sua morada no meio dos homens
e Se fez Filho do homem, para habituar o homem a sentir a Deus, e para habituar
Deus a fazer a sua morada no homem, segundo a vontade do Pai. Por isso, Deus
concedeu-nos como ‘sinal’ da nossa salvação Aquele que, nascendo da Virgem, é o
Emanuel’ (Santo Irineu)”.¹
O mundo moderno vive uma crise de fé. O homem se
coloca cada vez mais como o centro do universo. A distância do sagrado esfria o
coração humano e aumenta sua necessidade de Deus. A velocidade das
comunicações, aliada ao conforto vindo do progresso tecnológico, provoca uma
frenética busca da felicidade naquilo que o mundo pode oferecer.
O Advento é o tempo oportuno para uma desaceleração.
Tirar os olhos do mundo e buscar naquele que habita no meio de nós, a Luz que
retira o véu dos nossos olhos e nos faz enxergar plenamente o amor, que vem por
pura graça, nascido pequenino e frágil do seio de uma mulher, numa manjedoura,
humilde e próximo de nós, ao nosso alcance.
Com os olhos desvendados, na pequenez daquele
menino vemos a grandiosidade de Deus que se inclina, por puro amor e
misericórdia, para nos alcançar e resgatar à vida, eterna e plena para a qual
fomos criados.
Numa vigília constante, neste tempo da Igreja
(tempo da misericórdia), nos preparamos para o tempo do juízo, a vinda
definitiva e gloriosa do Filho Unigênito de Deus.
No Natal contemplamos Deus que se fez um de nós e
que estando à direita do Pai, age em nossa vida através da sua Palavra; nos
Sacramentos, especialmente na Santíssima Eucaristia.
Cheios de amor e confiança, pedimos na vigília do
Advento e, especialmente no Santo Natal, na oração que Ele nos ensinou: “Venha
a nós o vosso reino”!
Vinde Senhor Jesus!
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